O Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), uma das cortes mais antigas do país, proferiu importante decisão em favor de um posto revendedor de combustíveis da cidade de Petrolina/PE, contratado sob regime de exclusividade por uma das grandes distribuidoras nacionais.

O tribunal condenou a distribuidora a restituir ao posto o valor de R$ 2.160.000,00, correspondente à diferença de preços cobrados a maior durante a vigência do contrato.

A distribuidora sustentou, em sua defesa, que exercia a liberdade de preços garantida pelo livre mercado. Alegou ainda não existir obrigação legal de uniformizar preços dentro de sua rede de revendedores.

Entretanto, o TJPE, com fundamentos sólidos e profundos, rechaçou essa argumentação quando analisada sob a ótica dos contratos de exclusividade. Nesses contratos, o posto revendedor é obrigado a adquirir combustíveis exclusivamente daquela distribuidora, não tendo qualquer margem de negociação ou alternativa de fornecimento.

Na prática, o posto só descobre o preço do combustível no momento da compra, ao acessar o sistema da distribuidora. Ou aceita o preço imposto, ou fica sem produto para operar. Trata-se, portanto, de um cenário de desequilíbrio extremo.

O sofisma das distribuidoras — esclarecido de forma objetiva: De fato, para postos não vinculados por exclusividade, existe real liberdade de negociação: essas empresas podem buscar melhores ofertas junto a diversas distribuidoras concorrentes, de modo que só comprarão onde o preço for competitivo.

Já o posto cativo, vinculado por exclusividade, fica impedido de buscar preços alternativos. Ainda que o contrato, em tese, prometa preços “de mercado”, na prática a distribuidora fixa em seu portal unilateralmente o preço de venda, controlando integralmente a operação de compra do revendedor, violando os artigos 424 e 489 do Código Civil.

Enquanto concede promoções e preços agressivos para atrair novos postos independentes, a distribuidora impõe preços superiores aos postos já cativos, comprometendo sua competitividade.

O resultado: o posto não consegue disputar o mercado com igualdade de condições e, indiretamente, o próprio consumidor final também é afetado pelos preços majorados nas bombas.

A decisão judicial e os fundamentos jurídicos aplicados: O TJPE reconheceu que essa conduta viola normas centrais do ordenamento jurídico brasileiro: (i) Lei Antitruste (Lei nº 12.529/2011, art. 36, § 3º, X) — prática anticoncorrencial, com discriminação de preços entre revendedores de uma mesma distribuidora; (ii) Código Civil (arts. 421, 422, 423 e 424) — violação da boa-fé objetiva, da função social do contrato e nulidade de cláusulas que deixam o aderente sujeito ao arbítrio da outra parte; (iii) Teoria finalista mitigada, reconhecendo a vulnerabilidade econômica, técnica e jurídica do posto cativo diante da megaempresa distribuidora.

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O Tribunal deixou claro: contrato de exclusividade não pode ser instrumento de abuso. Ainda que legal, não autoriza práticas discriminatórias e desleais que inviabilizam a atividade econômica do revendedor.

No caso em análise, a distribuidora também foi condenada ao impor ao posto a adesão forçada a um plano de marketing não contratado — caracterizando venda casada, expressamente vedada pela legislação pátria.

Inconformada com a condenação, a distribuidora recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). No momento, o TJPE ainda analisa se o recurso reúne os requisitos necessários para que o caso suba à instância superior.

Este emblemático julgamento do TJPE é altamente representativo para a Justiça brasileira e pode servir de paradigma para inúmeros casos semelhantes que envolvem contratos de exclusividade no setor de combustíveis. Reforça a aplicação dos princípios de justiça contratual e da defesa da concorrência, protegendo revendedores cativos que ficam submissos a práticas comerciais abusivas destas megaempresas.

Enfim, este venerando acórdão desta Colenda Corte de Justiça de Pernambuco representa um marco relevante de equilíbrio contratual entre os postos de gasolina e as distribuidoras, reafirmando com fundamentos profundos que contratos de exclusividade não autorizam imposição de preços abusivos, por aplicação dos princípios da boa-fé, função social do contrato elencados no Código Civil Brasileiro, na Lei Antitruste e na Constituição Federal (artigo 170).

Antonio Fidelis é sócio do escritório Fidelis & Faustino Advogados Associados, com sede em Londrina/PR, e atua com especialização em contratos empresariais na área de revenda e distribuição de combustíveis. É autor do livro “Os Conflitos entre Postos de Gasolina com as Distribuidoras” (Editora Juruá), disponível na Biblioteca Digital do STJ (BDJur) e na Amazon. Possui ampla experiência na condução de litígios cíveis e comerciais envolvendo cláusulas de exclusividade, contratos de fornecimento e práticas anticoncorrenciais, assessorando postos revendedores em diversas regiões do país.

ANTONIO FIDELIS-OAB-PR-19759


AUTOR

ANTONIO FIDELIS 

Advogado atuante em todo o território brasileiro e sócio-proprietário no escritório Fidelis & Faustino Advogados Associados. Especializado em Direito Empresarial, notadamente nas áreas de estruturação de holdings, falências e recuperação judicial e contratos; Direito Bancário; Direito Administrativo (CADE – ANP – PROCON – IBAMA); Direito Civil, especialmente nas áreas de contratos, revisionais e renovatórias. Especializado em postos revendedores de combustíveis. É colunista do Blog do Portal e Academia Brasil Postos.

Foi Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil e Professor. Trabalhou por 15 anos no setor de distribuição de combustíveis, atendendo postos revendedores e grandes indústrias. Desde o ano 2000 presta serviços advocatícios para os postos revendedores filiados ao Sindicato dos Postos Revendedores do Paraná (Paranapetro).


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Advogado com atuação em direito contratual, com enfoque em contratos envolvendo Postos de Combustíveis, sendo que, no contencioso, atua, sobretudo, em Renovatórias, Revisionais; Despejo; Retomada e Rescisões contratuais.

2 COMENTÁRIOS

  1. SOU REVENDEDOR VIBBRA EM SALVADOR E TENHO SOFRIDO POR DEMAIS COM PREÇOS EXORBITANTES. GOSTARIA DE CONTATO DE V.SAS, PARA DISCUTIR INCLUSIVE A COMPRA QUE FIZ DE UM IMÓVEL E ELA NAO ME DEU A ESCRITURA.

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