A maioria dos postos de combustíveis, possuem uma relação contratual complexa, que em muitas vezes os mantém atrelados as distribuidoras, por contrato de locação, sublocação, compra e venda mercantil, comodato de equipamentos, mútuo mercantil, garantia hipotecária, alienação fiduciária, fiança, uso de marca, franquia etc.

Não se pode olvidar que no mundo globalizado de hoje os princípios da livre concorrência e do livre comércio são fatores primordiais para a sobrevivência das empresas.  No caso do posto revendedor, a própria Resoluções 41/2013 e 57/2014 da ANP, regula a liberdade comercial entre distribuidoras e postos de gasolina.

Assim, quando o revendedor optar por não exibir a marca comercial, deverá então identificar de forma destacada e de fácil visualização, em cada bomba abastecedora, a distribuidora de combustíveis que lhe forneceu o respectivo produto, além de ter que descaracterizar o posto, eliminando símbolos, ou logotipos que possam vinculá-lo a uma determinada marca.

Por outro, se o posto revendedor firma contrato de exclusividade com determinada distribuidora, tem então a obrigação de adquirir produtos somente daquela distribuidora, até porque é a única que pode vender ao posto. 

Verifica-se que, quando o posto é contratado por exclusividade, então se submete a cumprir as cláusulas contratuais muitas vezes padronizadas, leoninas e abusivas que são inseridas no contrato de adesão.

Estes contratos, estabelecem não raras vezes prazo contratual demasiadamente longo, quantidade mínima mensal para aquisição de combustíveis superestimada, e imposição de multa milionária, caso não adquiram a quantidade de combustíveis e lubrificantes por ela estipulada nos referidos contratos, além da renovação automática no silêncio das partes.

Situações como estas, ferem a comutatividade das prestações e a igualdade das partes perante o pacto.

Diante disto, os nossos tribunais de forma majoritária têm decidido pela anulabilidade destas cláusulas, porque afrontam o equilíbrio da relação contratual e a boa-fé objetiva, no momento em que coloca o posto, que é notoriamente a parte mais frágil economicamente, à mercê da distribuidora que em regra possui elevado potencial econômico.O princípio da pacta sunt servanda, o qual inspira a força obrigatória dos contratos, (o contrato faz lei entre as partes) não tem mais caráter absoluto no direito moderno, pois cede lugar ao princípio da função social do contrato, baseado este na boa-fé objetiva, que deve imperar nas fases pré-contratual e pós-contrato.

Neste norte, pinça-se trechos do acórdão prolatado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no agravo de instrumento nº 1910772, oriundo do Rio de Janeiro. 

Afinal, é no campo do direito das obrigações – e, mais especificamente, no dos contratos – que a autonomia da vontade mais se evidencia, caracterizando-se como verdadeiro princípio basilar do ordenamento jurídico pátrio. Ocorre que o direito moderno não se coaduna mais com uma concepção absoluta de tal princípio. Já se foi o tempo em que o pacta sunt servanda era utilizado como instrumento de opressão e de escravidão de determinados setores da sociedade.

Pois, no dizer de Mazeaud y Mazeaud, citado por Orlando Gomes: “entre o forte e o fraco é a liberdade que escraviza e a lei que liberta”. Hoje, portanto, prevalece o entendimento que enxerga uma função social nos contratos, atento a uma concepção de justiça contratual, procurando, sempre que possível, equacionar os interesses em jogo e reduzir as desigualdades substantivas das partes, desde que não sejam extrapolados os limites da preservação da segurança jurídica. Daí porque as legislações mais recentes passaram a fazer previsão de dispositivos concretos para servirem de instrumento ao julgador na hora de restabelecer a paridade entre as partes.”. (A.I no Resp 1910772).

Em regra, a parte que faz uso do pacta sunt servanda, invocando a força obrigatória dos contratos, ou seja, se assinou o contrato tem que cumprir, está superada pelo direito moderno pois tal cláusula se tornou anacrônica frente ao princípio da função social e a boa-fé.

A impossibilidade de revisão contratual, sob o argumento de que as partes teriam anuído com o seu conteúdo ou sob alegação do pacta sunt servanda é inaceitável frente a modernas postulados e à evolução do direito.

Dentro desta linha de raciocínio, não pode o polo mais fraco da relação, sacrificar a sua própria atividade, quando a sua fornecedora se aproveita da brecha que deixou no contrato, e com isso, fixa o preço em seu portal ao seu bel prazer, tendo como escudo a alegação da subsunção do pacto ao pacta sunt servanda.

Outro ponto de destaque a argumentar é que os postos que optaram por trabalhar com lucro presumido, têm a obrigação de recolher de I.R sobre o percentual de 1,6% sobre a sua receita, (artigo 15, § 1º, I da Lei 9.249/1995). O que se vê na prática é que a grande maioria dos postos recolhem o I.R pelo lucro real, logo, conclui-se que se não optou pelo lucro real é porque este ficou abaixo do lucro presumido de 1,6%, portanto, o lucro líquido dos postos em regra é extremamente baixo, portanto, qualquer variação de centavos nos preços de compra, podem levar o posto à ruína.

A moderna concepção dos contratos impõe aos hermeneutas o dever de examiná-los sob a ótica da sua função social e da boa-fé, cujos princípios suplantaram o império da teoria anacrônica do pacta sunt servanda, isto porque a sociedade é dinâmica, e por conseguinte o direito deve evoluir no mesmo ritmo da evolução social. 

Neste norte os tribunais têm decidido: “A autonomia privada preceitua que ninguém é obrigado a contratar ou a permanecer vinculado a ajuste que anteriormente se obrigou.” (TJ-DF- Apelação 0711689-12.2020.8.07.0007). Tal preceito decorre de que existem mecanismo compensatórios que podem mitigar eventuais prejuízos advindo da ruptura.

Enfim, se a teoria de que o pacta sunt servanda fosse aplicada sem que o hermeneuta adentrasse as suas filigranas, então a boa-fé e a função social dos contratos, seriam letras mortas, e o direito estaria em descompasso com a evolução social.

Destaque-se ainda que se fosse aplicado a ferro e fogo a teoria do pacta sunt servanda, muitos postos já teriam ido à falência, como bem sintetizado no vídeo disponibilizado pelo Canal Procon São Paulo, vide: https://www.youtube.com/watch?v=G0DQaXObP1U

Escrito por ANTONIO FIDELIS-OAB-PR-19759

Fonte: Portal Brasil Postos

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Escrito por :ANTONIO FIDELIS-OAB-PR 19759 e GUILHERME FAUSTINO FIDELIS-OAB-PR 53532 e OAB-SP-360025.

Saiba mais sobre o Autor

O Advogado Antonio Fidelis é  colunista do Blog do Portal e Academia Brasil Postos. 

Sócio proprietário da Fidelis & Faustino Advogados Associados juntamente com seu filho Advogado Guilherme Faustino Fidelis OAB-PR-53532 e OAB-SP- OAB/SP 360.025, e sua esposa Advogada Sonia Regina Faustino – OAB-PR-8410. O seu escritório está localizado em Londrina-Pr., porém, em razão da tecnologia, processos eletrônicos e virtual, atua em todo o Brasil.  

Foi Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, Professor, Sargento da Reserva do Exército, trabalhou por 15 anos na Shell atendendo postos revendedores e grandes indústrias. Desde o ano 2000 prestar serviços advocatícios para os postos revendedores filiados ao Sindicato dos Postos Revendedores do Paraná- Paranapetro. 

O seu Staff é especializado em direito empresarial, direito administrativo: CADE-ANP-PROCON. Ambiental: IBAMA e órgãos do meio ambiente. Contratos: Holdings, Falências, Recuperação Judicial, Revisionais, Renovatórias e toda a área de direito empresarial, especializado em Postos Revendedores de Combustíveis.

Atende em todo o Brasil e faz reuniões virtuais pelo sistema zoom, que pode ser marcada pelo fone: (43) 3341-2550 ou pelo telefone:  (43)99835-7828 ou (43)99118-7388 ou ainda pelo e-mail [email protected] 

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Advogado com atuação em direito contratual, com enfoque em contratos envolvendo Postos de Combustíveis, sendo que, no contencioso, atua, sobretudo, em Renovatórias, Revisionais; Despejo; Retomada e Rescisões contratuais.

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